sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

hipocrático, ou hipócrita ?!...

É notícia no JN e diz assim: “Médicos receitam sob pressão e para evitar processos judiciais.” Explica-se depois, citando José Manuel Silva, presidente da secção regional do Centro da Ordem dos Médicos, que esta é uma prática generalizada e não exclusiva em Portugal e porque, antes sobre que falte, não há risco de processo judicial se o médico receitar medicamentos a mais, ou desnecessários para a patologia em causa. Nem medicamentos, nem exames complementares de diagnóstico, do género, Raios X e essas coisas – essas coisas, que já agora e no caso dos raios X, haveriam de ser usadas com algumas parcimónia e rigor, já que, por exemplo, os danos colaterais de uma exposição aos Raios X são mais danosos do que se pensa e divulga. Danosos, para os próprios técnicos de radiologia. Adiante e vamos ao que importa.

O médico entrevistado pelo DN fala em “medicina defensiva” – termo técnico – e dá exemplos. O do doente, que não se conforma com o ir ao médico e vir-se embora sem uma receitazinha para aviar… É por isso que, mesmo não sendo preciso, diz este médico, há clínicos que acabam a receitar antibióticos para constipações ligeiras que lá iam perfeitamente com um cházinho de limão e meias grossas. Porque, voltemos ao depoimento recolhido pelo jornal…porque são cada vez mais, os processos judiciais sobre médicos que, alegadamente, falham na prescrição dos tratamentos realmente necessários. Por isso e na lógica dessa tal “medicina defensiva”, os clínicos tendem, como diz José Manuel Silva e citemos – "a exagerar na prescrição".

Não me vão ouvir aqui recorrer à blague do “se não morres do mal morres da cura”, porque não é preciso e o assunto é sério.

Voltando a José Manuel Silva, diz o médico que não é fácil e gasta-se tempo precioso, a explicar a um doente porque é que num determinado caso, o antibiótico é, não só desnecessário e inútil, como até talvez prejudicial.

Do nosso conhecimento empírico da matéria, concluímos este cenário simples: um agente treinado – chamemos-lhe assim – para search and destrói – como se diz na tropa – presenças invasoras inimigas… ainda mais um agente com um poder de fogo considerável, como é o caso dos antibióticos… Em chegando ao teatro de guerra, e não havendo inimigos à vista, é de esperar que ele dispare em todas as direcções, matando inclusivamente forças aliadas, como os anticorpos naturais do nosso organismo, glóbulos brancos e outra infantaria. É o chamado fogo amigo… Por isso… Também por isso, talvez fosse melhor falar em "medicina ofensiva". Porque, de um modo geral é disso que se trata. Na lógica de que a melhor defesa é o ataque.

Entretanto já quase esquecemos, ou passámos por cima da verdadeira razão dos invocados processos judiciais. E a razão parece ser o facto de haver médicos que falham nas suas funções, que ficam aquém do que se espera deles; ou seja, receitar o medicamente certo e justo para a maleita em causa; pedir os exames realmente necessários, para o despiste e diagnóstico da doença. É quando essa desatenção, ou incúria, ou erro de cálculo se verifica, que o médico é chamado à responsabilidade e eventualmente castigado. De caminho, convém que se lembre a gente que, com as regras a que a Ordem se submete, muito dificilmente imaginamos um médico a ser castigado só por causa de uma denúncia – ou se quisermos – uma queixinha, de um doente insatisfeito, por ter ido ao médico e vindo embora, sem um xarope para aviar. Em havendo denúncia, certamente que a Ordem vai investigar com todo o rigor onde está a razão e se houve de facto desleixo, laxismo, ou matéria crime. Se o doente não precisava de antibióticos nenhuns, quem de vós acredita realmente, que qualquer sanção possa recair sobre um médico qualquer, que se tenha recusado a prescrevê-los?... Bem me parecia.

Voltemos a José Manuel Silva, para abreviar e concluir. Diz o médico, que é mais fácil praticar a tal medicina defensiva, a prescrição por precaução. Mais fácil será, mas continua a ser um erro de gramática. Estou em crer que medicina “ofensiva”, seria mais correcto dizer-se. Ofensiva contra a fiscalização das boas práticas – como agora se diz… Ofensiva das defesas naturais do corpo humano… E ofensiva também, um bocadinho, vá lá, da nossa própria inteligência.

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