Meti a chave á porta e ela lá estava. Sentada no sofá da sala. Tinha ligado a televisão e mal se mexeu quando entrei. Parecia mesmo que nem me via e lhe eram absolutamente indiferentes as imagens que se agitavam em silêncio no ecrã. O silêncio da casa, só era quebrado p’lo matraquear da ventoinha eléctrica, espalhando o ar em toda a volta, num gesto repetitivo e sincopado.
O cabelo levantava-se-lhe um pouco, de cada vez que a ventoinha soprava na direcção dela. E era o único movimento que se lhe apercebia, enquanto os olhos se lhe perdiam p’la sala, vagos, aparentemente fixando-se em nada e nada vendo. A morte. Há dias que a vejo sentada ali, sempre no mesmo sítio, sem esboçar um gesto ou intenção. Procuro-lhe o olhar e parece que está sempre a olhar para outro sítio, ou através do meu corpo, para além do fundo dos meus próprios olhos. Há alturas em que sinto a irritação subir-me p’lo peito e apetece-me gritar-lhe aos ouvidos palavras obscenas, beliscar-lhe a expressão ausente, sacudi-la p’los ombros. Outras vezes queria deitar todo o peso do meu corpo no colo dela e que a mão dela me acariciasse a cabeça, muito de leve, como a mãe ao filho que adormece, ou a virgem da pietá a um cristo descido da cruz. Mas ela continua ali sentada, sem um gesto ou reacção, como se não me visse, mas sabendo-me todos os gestos e pensamentos. Gostaria de a achar elegante e sentir-lhe o desejo e o encanto, mas, na verdade, acho-a uma seca e uma visita bastante estúpida e inconveniente.
O cabelo levantava-se-lhe um pouco, de cada vez que a ventoinha soprava na direcção dela. E era o único movimento que se lhe apercebia, enquanto os olhos se lhe perdiam p’la sala, vagos, aparentemente fixando-se em nada e nada vendo. A morte. Há dias que a vejo sentada ali, sempre no mesmo sítio, sem esboçar um gesto ou intenção. Procuro-lhe o olhar e parece que está sempre a olhar para outro sítio, ou através do meu corpo, para além do fundo dos meus próprios olhos. Há alturas em que sinto a irritação subir-me p’lo peito e apetece-me gritar-lhe aos ouvidos palavras obscenas, beliscar-lhe a expressão ausente, sacudi-la p’los ombros. Outras vezes queria deitar todo o peso do meu corpo no colo dela e que a mão dela me acariciasse a cabeça, muito de leve, como a mãe ao filho que adormece, ou a virgem da pietá a um cristo descido da cruz. Mas ela continua ali sentada, sem um gesto ou reacção, como se não me visse, mas sabendo-me todos os gestos e pensamentos. Gostaria de a achar elegante e sentir-lhe o desejo e o encanto, mas, na verdade, acho-a uma seca e uma visita bastante estúpida e inconveniente.
26 maio 05 júpiterる