quinta-feira, 25 de outubro de 2007

É sempre de louvar o esforço e aplicação de quem estuda e analisa e faz contas sérias e responsáveis, seja à nossa economia, seja ao nosso estado de saúde, às nossas expectativas e desideratos…
É uma boa ferramenta de trabalho, quando tem de se governar seja o que for, desde a mais modesta família à mais próspera Nação. Tomar o pulso à realidade, estudar-lhe os movimentos e tendências…
E de tudo isso vamos sabendo, p’los jornais, por exemplo…
O FMI diz que Portugal qualquer coisa…
Bruxelas analisa a economia portuguesa e conclui que…
O Banco Central Europeu fez as contas…
Os indicadores económicos revelam…

Mas nos jornais, se virmos bem, anda aí uma outra economia paralela, a que se calhar não se tem dado a merecida importância!

Volto ao exemplo das caixas Multibanco; todos os dias se fala do roubo, ou tentativa de roubo de uma ou duas. E ainda mais… o processo escolhido: arrancá-las da parede, por meios mais ou menos violentos.

No Funchal, os assaltantes, cara tapada, assaltaram uma ourivesaria à machadada. Partiram tudo e levaram mais de 500 mil euros em valores.

Em Montalegre, num café, dois sujeitos entraram, lançaram um petardo e fugiram de seguida, sem mais nem menos. A explosão destruíu uma boa parte do café.

Em Vila Real, foi preso um homem de 82 anos, que traficava armas e moeda falsa.

Em Gondomar, de cara destapada, o ladrão obrigou o ourives a dar-lhe o carro, mais o ouro todo que tinha lá dentro e ponto final. Era para aí mei’dia, hora d’almoço…

Depois há também situações mais anedóticas, como a deste ladrão de automóveis, que, como não tinha dinheiro para a gasolina, resolveu pedir uns trocos de ajuda a quem passava. Pouca sorte, que o polícia estava à civil… Estava à civil, mas estava de serviço. Sempre de serviço, reconheceu o carro; acabou também por reconhecer o ladrão, que andava a monte da Santa Cruz do Bispo, há uma semana já…

Eventualmente, esta sucessão desgarrada de acontecimentos, pouco valor científico, técnico, ou contabilístico terá… mas de uma terra, onde quase todos os dias se arrancam caixas Multibanco da parede, com ajuda de retro escavadoras ou explosivos artesanais…
Onde se entra por uma ourivesaria, como Átila, o huno e se destrói tudo à machadada, para levar o ouro e os relógios que estão na montra…
Onde se entra num café e se estoira a mobília toda a petardo, eventualmente só porque sim, já que, neste caso, não houve roubo…
Onde um octogenário, em vez de estar calmamente a gozar a sua terceira idade, anda ainda metido em esquemas de contrafacção de moeda e tráfico de armas, para governar a vida…

Muitos relatórios pode Bruxelas redigir e publicar aos 27 ventos da União… Em Portugal, a economia nossa de cada dia… cada um sabe da sua.

quarta-feira, 24 de outubro de 2007

João Botelho retirou a assinatura do filme e entretanto ela move-se… a comunicação social, à volta da polémica, do inédito da situação. E entretanto ela move-se a expectativa à volta da Corrupção, que era de João Botelho e agora será de Alexandre Valente, quando chegar às salas, a 1 de Novembro.
Ontem, Valente, em conferência de imprensa, disse mesmo que vai ser um filme de produtor e disse também que, plo contracto, um produtor pode cortar, escolher, editar como entender, que é coisa até normal. Como se sabe, terão sido cortes e montagens feitas à revelia de João Botelho, o que terá feito estalar o conflito entre os dois cineastas – realizador e produtor… O produtor acha que o contexto do filme não sofreu com os cortes… Botelho não acha e porque diz que não foi tido nem achado na montagem, então sai fora da ficha técnica. Diz-se que as cenas cortadas foram coisa mínima, cenas em que quase não se passaria nada, ou quase nada de relevante para a trama do enredo… Botelho diz que ele é que sabe, se fazem falta ou não…
Razão terão eventualmente ambos… que nestas coisas, um teimoso nunca teima sozinho…
Agora vamos a ver… Corrupção, o filme, parte, e ninguém ainda o desmentiu formalmente, do livro de Carolina Salgado e da escandaleira que envolve actividades ilícitas, se não criminosas mesmo, no futebol nacional e as ligações criminosas entre vários poderes públicos, semi públicos e privados… Episódios picarescos, com assaltos e espancamentos por encomenda, troca de favores, sexuais e outros… e tudo isto narrado por interposta pessoa, em nome daquela que foi namorada, companheira, amante, ou qualquer coisa de Jorge Nuno Pinto da Costa, personagem que - mesmo sem apitos dourados - já dava um filme, p'lo vulto e protagonismo que tem tido, em episódios vários da vida nacional. Ou mesmo só ele próprio, pela pose, pela verve… Mas não! Junta-se ainda a jovem e assustada Carolina, que – nos jornais mais recentes – dizem que é agora arguida num processo de uso, tráfico e incitamento ao consumo de drogas.
Com esta matéria prima… o sucesso pareceria fácil à partida. Especiosa, sumarenta, nesse lusco-fusco sórdido, quase série B, à escala lusitana.
Claro que todos os que falaram já em nome do filme de João Botelho, que João Botelho não assina, se recusam a admitir que o filme faça mais do que inspirar-se no livro. Como se, antes do livro, o assunto em si não tivesse já pano para todas as ficções… Não fosse já assunto mais que falado e discutido na sociedade portuguesa… Como se fosse preciso o sucesso e a polémica que o lançamento do livro provocaram, para alguém despertar para o assunto e pensar: “oh diabo! Isto até dava um filme”.
Isto o quê? O livro, a escandaleira que o rodeou, ou a corrupção no futebol e na sociedade portuguesa em geral, ou – pra não assustar ninguém – só em casos muito pontuais e lamentáveis?... Seja o que for, o filme fez-se e do que me lembro, falou-se mais que o filme não pretende retratar ninguém, de que o filme não vem à boleia de outros sucessos recentes… do que me lembro, talvez se tenha falado mais do que o filme não era!
A verdade é que, saber o que o filme é, de facto, só se saberá no dia mesmo da estreia, já que não haverá, ao que parece, projecções anteriores para a crítica e comunicação social…
Um pequeno pormenor, talvez até despiciendo, mas em que, por exemplo o Diário de Noticias reparou e fez questão de referir na edição de hoje… enfim, outra novidade!
Mas enfim, o país não tem uma indústria cinematográfica por aí além, portanto é natural que o nervosismo se instale, quando a expectativa é grande e a responsabilidade também… Vai-se a ver e daqui por um tempo, João Botelho e Alexandre Valente ainda se vão rir disto tudo e quem sabe voltar a trabalhar juntos em harmonia e sem discussões insolúveis.
Até lá, fica a Corrupção.
Sem assinatura do realizador, que se queixa de ter sido corrido da mesa de montagem …
Fica a Corrupção: acto ou efeito de infectar… as relações entre os dois cineastas .
Fica a Corrupção: acto de adulterar… de Alexandre Valente, que alegadamente adulterou a ideia inicial do realizador .
Fica a Corrupção: desmoralização… de João Botelho, que terá desistido da discussão e preferiu riscar-se da ficha técnica.
E fica a Corrupção "tout court" à volta do filme, ele próprio e todo o fenómeno que se gerou à volta dele .
Corrupção, aqui no sentido de sedução, que é outro dos que cita esta 5ª edição do dicionário de Língua Portuguesa, que tenho aqui à minha frente. Não vos digo a editora, por causa da publicidade, mas digo-vos que é uma edição de 83, que ainda deve estar relativamente actualizada.
Sobra ainda, para fechar rapidamente, a Corrupção: apodrecimento, decomposição. Coisas que, como se sabe, deixam sempre um cheiro típico e desagradável. E aqui não me ocorre nenhuma comparação possível com o caso em apreço…