sexta-feira, 7 de novembro de 2008

Ora vamos a contas

Ora vamos a contas.

Mais de 20 mil gestores podem vir a ser constituídos arguidos, por fuga ao Fisco.

Vem no DN, que a operação "Resgate Fiscal" já recuperou cerca de 114 milhões de euros, juros e coimas incluídos, em IVA e IRS cobrados e não entregues aos cofres do Estado.

Mais de 20 mil administradores e gerentes foram notificados e têm 30 dias para regularizar a situação. É uma última oportunidade, que o Fisco dá a estes faltosos. Ao todo, diz o jornal que há mais de 33 500 notificações, passadas pelas autoridades fiscais. Ao todo também, diz ainda o Diário de Notícias, há umas 50 mil empresas que, por costume, ficam com o IRS descontado pelos trabalhadores. Algumas são já reincidentes, na lista negra do Fisco. Mais de 10 mil empresas e empresários estão sob suspeita daquilo a que tecnicamente se chama: "abuso de confiança fiscal"… Isso, se encararmos o delito do ponto de vista do Fisco. Se considerarmos o ponto de vista do trabalhador, que descontou o respectivo e devido IRS e, no final das contas feitas, fica, por tabela que se seja, ele também em falta com as Finanças… a isso poderá dar-se outro nome. Fica ao critério de cada um dos eventuais lesados, a liberdade do baptismo. Podem usar linguagem menos técnica, se quiserem.

Adiante. Outras contas. Ainda à volta do caso BPN… o Diário de Notícias abre hoje duas páginas de destaque ao assunto.

Um dossier onde – e fiquemos só pela entrada… onde se fica a saber que o Estado português herdou uma dívida, que pode chegar aos 500 milhões de euros da SLN- Sociedade Lusa de Negócios. Diz o jornal, que as empresas do grupo tinham uma conta calada de dívidas ao Banco Português de Negócios, que as financiava, que anda entre os 300 e os 500 milhões de euros. Ao nacionalizar o BPN, o Estado fica com uma palavra a dizer sobre o futuro dessas empresas.

Entretanto e em relação ao desaire do Banco Português de Negócios… o Sindicato dos Bancários do Centro reclama que todos os responsáveis sejam sancionados de forma exemplar.

Ainda e em relação ao BPN… ontem mesmo, durante o debate parlamentar do Orçamento, Teixeira dos Santos terá garantido que esse era o único banco com problemas e que, para além do BPN, não há em Portugal mais nenhum banco em crise, ou como o ministro disse: com problemas de solvabilidade. Disse que, tudo o que se vai dizendo e ouvindo, mais não é que rumores que podem abalar o sistema financeiro – o que não é bom, já que esta é uma questão muito séria, como fez questão em sublinhar. E disse mais, para concluir… que, na altura em que garantiu ao país que não havia em Portugal instituições bancárias com problemas, o BPN tinha um plano estratégico de recuperação. Tudo tranquilo, portanto. O pior é que esse plano acabou por, mais tarde, se revelar irrealizável. Ou, como disse Teixeira dos Santos, “não concretizável”.

Foi só isso.

E…

Haverá ainda lugar no Inferno, para mais boas intenções?

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

PALHAÇADA

A ideia parece que seria instalar cabines de voto no hotel, para os hóspedes não terem de se deslocar e poderem exercer o seu direito, o seu dever cívico de votar nas presidenciais de ante ontem, nos Estados Unidos da América do Norte.

Acontece que, o hotel em questão é um resort naturista – chama-se “Caliente Resort” e fica na Florida. Enfim, o nome do resort , “Caliente Resort” é, só por si, já um pouco – digamos – curioso – no mínimo, mas isso , para o caso, pouco interessa. O que conta… o que se conta… É que a administração do hotel pediu aos responsáveis pelas eleições no condado de Pasco, na Florida, que se criasse uma cabine de voto, nas instalações do hotel, com a hipótese – ou, aliás, como escreve o Correio da Manhã – com a "opção" do voto nudista. Portanto, o que se pedia era, não só, a instalação de uma cabina especial de voto para os hóspedes do hotel, como ainda a possibilidade de eles irem votar todos nus.

Consta que o pedido foi recusado pelo supervisor das eleições em Pasco. Recusou, dizendo que se tratava de uma manobra publicitária, o que estava aqui em causa. Subentende-se que… uma campanha publicitária ao próprio hotel, não tanto ao naturismo… Subentende-se também, que esta terá sido a resposta simpática, ou se quisermos, como se diz, politicamente correcta para dar a volta à situação.

Ou se quisermos, uma outra forma de dizer… tenham mas é maneiras.

PALHAÇADA #2

É verdade que lhe fica bem, o véu. A Ghada El Tawil, egípcia, jornalista e pivô da televisão. Fica-lhe bem, emoldurando-lhe o rosto de pele fina e rosada, os olhos castanhos de um brilho quente e meigo. Na fotografia, ela sorri para nós, com a expressão de um contentamento que só ela sabe e entende. Nós, sabemos só que ela acaba de vencer a batalha, em nome de Alá.

O que se passa, conta o Diário de Notícias, é que Ghada El Tawil estava afastada há 6 anos dos ecrãs, por causa de um certo braço de ferro com a administração do canal 5 de Alexandria. Porque ela insistia em usar o véu islâmico, durante a apresentação do telejornal. O canal 5 é do Estado e o Estado egípcio é um Estado laico. Daí a proibição, por razões estéticas, obviamente e depois porque, sendo o Egípto um Estado laico, não se justifica que as mulheres andem sempre, religiosamente, de véu na cabeça.

Seja como for, a jovem jornalista recorreu para os tribunais e os tribunais acabaram por lhe dar razão e aceitar, que usasse o símbolo islâmico no local de trabalho. É aliás uma tendência que vem a acentuar-se nos últimos tempos no Egipto. Há cada vez mais mulheres, pelo menos nas pequenas cidades, a aderir à moda – enfim, chamar-lhe moda pode não andar muito longe da realidade, mas soa, se calhar, um pouco mal, neste contexto – chamemos-lhe então, "o "Uso" do véu islâmico, o “hijab”.

Quanto a Ghada El Tawil… regressou ao trabalho, mas de forma um pouco discreta. Para já, só apresenta debates, mas está decidida a recuperar o posto que ocupou durante 12 anos, o de apresentar os telejornais, em horário nobre. E porque, diz, quando cobre o cabelo, não perde a capacidade para ler as noticias … Admita-se que não. Também se pode admitir, que, se tirasse o véu quando trabalha, também isso não chegaria para lhe enfraquecer a fé, ou desrespeitar o altíssimo, mas isto é só uma hipótese académica, claro.

O Diário de Notícias remata a prosa com a pergunta: “que razões levam estas mulheres a tomar atitudes que o Governo laico do Cairo tem dificuldade em aceitar?” Dá depois a resposta, pela voz da nossa protagonista. Diz a jovem Ghada el Tawil que, à medida que os anos passavam, começou a sentir que queria fazer o que deus queria… Queira deus, que deus queira e lhe peça mais qualquer coisa de realmente interessante, do que apenas andar de cabeça tapada com um véu…

Fica-lhe bem, é verdade, mas como profissão de fé, parece curto.

Depois, só falta ressalvar essa atitude do Governo do Cairo. Apesar de laico, admitiu e aceitou o uso do véu consagrado pela fé islâmica. Assim mesmo. Magnânime, compassivo, generoso… como um deus.

PALHAÇADA #3

Diz assim: “PSD quer suspensão de deputado que mostrou bandeira nazi.”

Vem no Público e, com mais, ou menos destaque, nos outros jornais também.

O deputado de que se fala é José Manuel Coelho, que ontem desfraldou uma bandeira com a suástica em plena sessão parlamentar, para ilustrar o insulto e comparar os sociais-democratas da Madeira a fascistas.

A sessão foi imediatamente suspensa e a Assembleia Legislativa vai apresentar queixa ao Ministério Público, contra o deputado do Partido da Nova Democracia.

A acusação é a de propaganda nazi, coisa proscrita pela Constituição da República. Os sociais-democratas da Madeira querem mesmo que o deputado seja suspenso de funções parlamentares. Na altura, abandonaram a sala em sinal de protesto. O presidente da Assembleia, Miguel Mendonça considerou extremamente grave e citamos: “um deputado desta casa ir ao parlamento e desfraldar a bandeira nazi.”

Quanto ao deputado em questão, José Manuel Coelho, segundo o que documentam as gravações do episódio e as transcrições dos jornais, terá dito que os sociais-democratas estão travestidos e camuflados de sociais-democratas, mas são da extrema-direita. São fascistas. E que o 25 de Abril nunca foi celebrado no parlamento madeirense, por ordem do chefe fascista supremo, que manda nesta terra – a Madeira – e que nunca se converteu à democracia. Isto foi o que diz que disse, José Manuel Coelho.

Comecemos por aqui. O deputado desfraldou a bandeira para reforçar a ideia, para ilustrar o desabafo. Enfim, para chamar fascista a Alberto João Jardim e a todos os sociais-democratas madeirenses. Os do continente ficaram, para já, a salvo das acusações… De saída terá deposto a bandeira sobre a bancada do líder parlamentar do PSD, acusando-o de fascista e de traidor à Madeira e que a Madeira é governada por um regime nazi, fascista e populista.

E continuamos no mesmo registo, o do insulto, que se demarca do da pura propaganda, seja ao regime nazi, ou a sabonetes de alfazema.

Mas, segundo consta, a queixa que vai seguir para o Ministério Público é de propaganda nazi, coisa proibida pela Lei Fundamental da Nação Portuguesa. A mãe de todas as leis. A Constituição.

Ora, José Manuel Coelho, que se vai tornando conhecido mais pelas intervenções espectaculares, do que propriamente por iniciativas legislativas, ou propostas políticas relevantes – lembram-se de o ver com um enorme relógio de cozinha pendurada com uma guita à volta do pescoço, em protesto contra uma outra qualquer coisa, que de momento me escapa?... parecia o coelhinho da Alice no país das maravilhas… pois o que este Coelho, José Manuel Coelho fez foi insultar os colegas de bancada e o presidente da região. Se isso é razão para o expulsar do parlamento, ou até mesmo da ilha, ou do país… isso é outra coisa. Castiguem-no por falta de educação, falta de sentido das oportunidades, falta de sentido de Estado, falta de sentido, latu sensu mesmo, se quiserem… Agora, propaganda nazi?!...

Não tínhamos já ultrapassado essa fase?!...

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Pão seco

É notícia no 24 Horas. Chamar cão seco custa 500 euros. O título é quase enigmático. Vamos aos factos sem mais demora. Os factos remontam a 2005. Em Vale de Cambra, o fogo lançava o caos nesse Verão escaldante. Os bombeiros andavam numa aflição, para conseguir chegar a todos os focos, que ameaçavam floresta, casas e populações. Acontece que, este vizinho resolveu usar a água de um tanque público, para regar feijões, em vez de deixar que os bombeiros a usassem para atacar os fogos. Os outros vizinhos reclamaram, a conversa azedou e de tal forma que este agricultor se terá virado para um deles, bramindo a enxada e ameaçando-o de morte. Frases que o jornal transcreve: “Eu hei-de matar-te” e “vais ficar com as tripas de fora”. Como na altura estava por ali a guarda republicana, a queixa seguiu para o tribunal.

E já vai longa a descrição. Vamos ao que importa. A Relação do Porto acha que não há matéria crime. A ver… Ameaçar que se vai matar alguém, sem dizer quando, não chega para uma condenação. Diz o acórdão, que não se pode concluir, que tais palavras queiram anunciar uma intenção de agressão, ou morte no futuro. Ora, se há coisa que tais palavras fazem, é isso mesmo – anunciar a intenção de agredir ou matar – num futuro incerto, ou até mesmo improvável, mas a intenção está lá bem expressa e anunciada. Adiante. Diz que, como não se dizia, como a lei exige, a data em que a hipotética vítima ficaria com as tripas de fora, não se pode falar em ameaça. Mas há mais. Há que, quando proferiu as tais palavras, que, como já vimos, não podem ser legalmente consideradas como ameaça, o agricultor de que falamos ergueu a enxada em direcção ao queixoso. E aqui, a lei é bem clara. Tratava-se de um mal a consumar no momento. Reparem nele, furioso, fora de si, enxada ao alto pronta a desferir o golpe decisivo no vizinho … É isso mesmo. E é por isso mesmo que não se pode falar em ameaça. Ou pelo menos, em crime de ameaça. A ter existido, seria um crime de agressão. O que não aconteceu. A agressão. Ou seja, ficou-se pela ameaça. Ou não. Afinal não. Ou seja, aparentemente tudo ficou pela intenção. Ou se quisermos, pelo exemplo. Como quem diz: se fosse para te desfazer a cabeça com esta enxada, seria mais ou menos assim, percebes? E isso é coisa que provavelmente seria muito desagradável e até deselegante… Mais por aqui. Não uma ameaça, portanto.

Mas falta o título e o título dizia que chamar cão seco custa 500 euros.

Porque acontece que, no meio da contenda, o nosso agricultor insultou o vizinho, chamando-lhe cão seco. Ora isso é que não pode mesmo ser. Por isso, a Relação do Porto condenou-o a 70 dias de multa, à taxa diária de 5 euros. Enfim, pelas minhas contas, 5 vezes 70 dá 350, o jornal fala em 500 euros de multa, deve ser com os emolumentos e outras custas… Não importa; o que conta mesmo é a decisão da Relação do Porto. Diz que referir, mesmo em tom exaltado, que se vai pôr as tripas ao sol a alguém ainda é o menos, (enfim, não é bem assim. Se o exaltado agricultor tivesse gritado: vou-te pôr as tripas de fora, depois de amanhã em sendo meio dia… aí a conversa seria outra, decerto…)agora chamar cão seco a uma pessoa e ainda, como foi o caso, a um ancião de mais de 70 anos de idade… isso prefigura uma conduta ilícita, com o propósito de ofender a honra e consideração públicas da vítima.

Se ao menos tivesse acrescentado um "com todo o respeito", ou um "sem ofensa"… agora cão, só assim e a seco… É crime.

Ah, já agora. No meio da confusão toda quem acabou por ficar a seco, foram os feijões. Com a barafunda que se instalou, o agricultor acabou por deixá-los sem rega, nesse verão escaldante de 2005.



Publicidade enganosa; é o que é.

Por isso é que a entidade responsável condenou a campanha e exigiu que fosse imediatamente suspensa e retirada das televisões. A campanha, em que o campeão olímpico Nuno Delgado e a apresentadora e actriz Adelaide de Sousa aparecem fazendo o elogio da Margarina e das Gorduras Vegetais.

Porquê margarina? Porque e as boas gorduras fazem bem ao coração. É o que diz a campanha. As boas gorduras são as de origem vegetal, em confronto com a manteiga, de origem animal, que, segundo a mesma campanha, é uma gordura má, que faz mal ao coração. E do que faz mal ao coração deve perceber, mais que ninguém, a Fundação Portuguesa de Cardiologia, que patrocina a campanha, juntamente com o Instituto Superior Egas Moniz. São as duas instituições tutelares… os rostos credíveis. O aval, que sustenta e pretende convencer os mais cépticos.

A campanha está um pouco por todos os meios de comunicação social. Começou em Julho. Agora a Lactogal – pelo nome suspeita-se que esteja ligada à indústria leiteira e daí, eventualmente, à produção de manteigas – gordura animal portanto, ou seja, a outra... apresentou queixa. A queixa seguiu para o Instituto Civil da Autodisciplina da Publicidade, que concorda que estamos perante um caso de publicidade enganosa. Esta de dizer-se que as boas gorduras – neste caso as margarinas vegetais – são saudáveis para o coração… Diz, o despacho do Instituto regulador da publicidade, que a campanha desrespeita os princípios da veracidade e da proibição de publicidade enganosa. Que quebra também as regras relativas às alegações nutricionais e de saúde sobre os alimentos.

Ora, um responsável pela Fundação de Cardiologia, no caso, Luís Negrão disse ao jornal 24 Horas, que publicidade enganosa coisa nenhuma. Diz que, a Fundação promoveu as margarinas, que do ponto de vista nutricional e em termos de gordura são mais saudáveis que as manteigas. O médico sublinha, que o que está em causa é só essa comparação. Entre manteigas e margarinas. Diz que é forçoso que se desmistifique a crença, de que a margarina não presta para pôr no pão.

Ora, do que se sabe, o perigo maior das gorduras animais, vegetais, ou o que seja é justamente o cozinhado. Ou seja, aquecê-las acima de certa temperatura. Aí é que umas se revelam francamente mais criminosas que outras, se bem que nenhuma delas se recomende por aí além… em fritos. Isso. Agora em cru… O tal mito de que o médico fala, cheira-me que tem mais a ver com o poder de compra de cada um, do que com cuidados especiais de saúde. Sempre houve quem pusesse margarina no pão, simplesmente porque é mais barato do que manteiga. E isso é um facto histórico, perdoem-me os dietistas.

Mas voltemos aos argumentos do médico Luís Negrão, da Fundação Portuguesa de Cardiologia. Diz que, na campanha não se compara a margarina a coisas como, por exemplo, fruta ou produtos hortícolas. Aí haveria abuso, dizer-se que pão com margarina faz melhor ao coração que uma salada de couve roxa, ou uma fatia de melão de Almeirim… Mas não. Aqui, reafirma Luís Negrão, o que se diz é que a margarina, comparada com a manteiga de vaca, ou outro animal leiteiro, faz menos mal. Ou seja e citemos – “está cientificamente provado que as manteigas são mais prejudiciais à saúde do que as margarinas.” Ora, entre um mal menor e uma panaceia – como se anuncia - saudável para, no caso, o coração… vai uma distância considerável.

Não tão longe quanto isso, muitos de vós ainda se deve lembrar de campanhas um pouco semelhantes, em que se anunciavam as propriedades quase milagrosas de coisa como os ovos, ou até mesmo as batatas e o peixe congelado. Também na altura era em nome da saúde pública e do bem-estar de cada um, que se convidava o povo a comer ovos todos os dias, logo de manhã, em dejejum. Lembram-se do slogan? “Um ovinho pela manhã boa ideia da mamã” e “oh Pedro, não espremas a galinha!” Foi uma campanha de sucesso, esta. Um pouco pateta, às vezes, mas isso fazia parte da estratégia. Enfim, nunca tão pateta como essa outra mais recente ainda, em que se garante a perda de apetite, a quem beber não sei quantos litros de água mineral. Perder a fome, nem sei se será boa ideia, que o corpo precisa de se alimentar…Agora, para o resto, é bom de certeza. Não há nada que a água não lave. A cara, por exemplo. E os olhos. Olhos lavados vêem com mais clareza. Com mais frescura, pelo menos.

terça-feira, 4 de novembro de 2008

Dia de eleições.

Dia de eleições. Escreve o jornal na página dedicada à programação televisiva do dia. E em dia de eleições, dois filmes sobre os Estados Unidos. Nem mais.

“Ray”, sobre a vida de Ray Charles. Filme que valeu o Óscar para o protagonista Jamie Fox e "Na Linha de Fogo" de e com Clint Eastwood. Dirty Harry faz aqui o papel de um segurança perseguido por uma falha no seu passado e que faz tudo para defender a vida do presidente norte americano. É o que diz a sinopse. Ambos os filmes passam esta noite.

Ora diz o título que em dia de eleições a televisão passa dois filmes sobre os Estados Unidos, ou onde, pelo menos, a acção e assunto se centram. A questão que fica em aberto é saber, se hoje não fosse dia de eleições, a televisão passaria que filme? O pátio das Cantigas, o Leão da Estrela?

Adiante. Filmes. Este é mesmo à americana. Até os actores falam em inglês, apesar da acção se passar em Portugal e o filme ser português.

O filme é de Leonel Vieira e chama-se A Arte de Roubar. O jornal, o Diário de Noticias escreve que Leonel Vieira brinca aos filmes americanos. O próprio já reconheceu a influência dos irmãos Cohen e de Tarantino, na realização desta Arte de Roubar. Muita violência, muito efeito especial. Só a pós produção levou quase um ano de trabalho, p'ra que vejam!... O filme começa com dois homens num carro. Um deles vestido de toureiro está a sangrar. O outro leva na mão uma orelha conservada entre dois gelados. O jornal não explica se a orelha em questão é de um touro que o toureiro tenha mutilado durante a lide, ou, mais sinistro que isso, é um orelha humana. A hipótese de ser uma orelha de porco pode afastar-se por absurda e sem contexto.

Palavrões. Ouvem-se palavrões, logo a abrir o primeiro plano da acção. Palavrões em inglês; ou melhor, em americano, que como se sabe, pelo menos nos filmes deste género, série B, filme negro, os palavrões em norte-americano têm outro impacto e de longe outro estatuto.

Continua o jornal, explicando o ambiente da fita: Um golpe que tinha tudo para ser perfeito, corre mal.

Ora o filme estreia 5ª que vem e, já se disse, é todo falado em inglês. O realizador quer acreditar que só esse facto lhe pode abrir as portas do mercado internacional. Diz mesmo que esta Arte de Roubar há-de vender mais lá fora do que qualquer filme português alguma vez realizado até hoje… E falam em inglês porque os protagonistas, no enredo, são dois emigrantes, um português e um espanhol que viveram nos Estados Unidos. Era essa a ideia inicial. Dois emigrantes que vivem, ou são expatriados dos Estados Unidos para as suas terras natal. Daí, pô-los a falar inglês. E já agora, porque o elenco é internacional também – portugueses, espanhóis, brasileiros – assentou-se que todos falariam inglês, sem grande preocupação de fingir que são mesmo nativos dessa língua, cada um como pode e sabe, mas em inglês. Até as personagens secundárias vão falar inglês. Aliás aqui, garante o realizador, ninguém há-de ir ao engano e, apesar das lezírias do Ribatejo se parecerem muito com o deserto do Texas, Leonel Vieira garante que toda a gente há-de perceber que são as lezírias ribatejanas, o cenário da acção. Diz que, o importante aqui são as personagens e não o lugar. E diz também, como já vimos, que espera que este filme tenha lá fora um sucesso como nunca o cinema português, mesmo falado em língua estrangeira, nunca alcançou até hoje. Garante que já tem sinais positivos nesse sentido. Ecos favoráveis. E nem é de estranhar. Coisa de que o mundo e os cinéfilos em particular estão famintos é de filmes falados em inglês, com ladrões e assassinos a dizer palavrões e a passear orelhas amputadas entre dois rajás fresquinhos pelas lezírias do Ribatejo.

E em dia de eleições presidenciais nos Estados Unidos da América do Norte é de toda a justiça que se destaque aqui uma figura central na história da jovem nação… O Homem Aranha. E já não é só um boato. A notícia acaba de ser confirmada pelo New York Times. O Homem Aranha está de volta com o quarto filme da saga. Os 3 primeiros renderam perto de 2 milhões de euros, é obra.

Este agora trás uma mais valia. É que o argumento vai ser escrito por um prémio Pulitzer: David Lindsay-Abaire.

O Diário de Notícias deixa a pergunta: depois de uma educação de excelência, reconhecimento global e a distinção com um prémio Pulitzer, o que resta a um proclamado intelectual que, apesar do título, nunca perdeu a paixão por tudo o que é pop?... Escrever o argumento para um filme do Homem Aranha, ora aí está.

A estreia está marcada para 2011 e recupera o actor Tobey Maguire, para o papel do protagonista e super herói e o de Sam Raimi, como realizador do filme.

Mas a surpresa é relativa, esta de um escritor premiado com o Pulitzer se entregar a esta escrita, que poderíamos eventualmente considerar menor… eventual e injustamente, diga-se sem rodeios. Já no segundo filme da série, a ficha técnica incluía o nome de outro premiado, Michael Chabon, vencedor do Pulitzer de ficção em 2001. O mesmo para Alvin Sargent – diz o jornal que é cavalheiro com história construída em Holliwood desde meados dos anos 60… também ele colaborou no argumento do 3º filme da série.

Quanto a David Lindsay-Abaire, já há dois anos deu que falar com a estreia, na Broadway, de Rabbit Hole – a cova do coelho, peça que lhe valeu 4 Tony's – incluindo o de melhor peça de teatro, desse ano. Antes, em 99, a crítica aplaudia-lhe Fuddy Meers, comédia que convenceu até os mais críticos da escrita de Lindsey- Abaire.

No cinema mesmo, a assinatura de David Lindsay lá está, na ficha técnica, como co autor do argumento do filme Robots. Filme de animação realizado em 2005.

Agora cabe-lhe inventar novas aventuras para o Homem Aranha. Um dos super heróis mais famosos dos Estados Unidos. Inventar-lhe perigos terríveis e aterradoras ameaças. Não a ele pessoalmente, coitado, mas ao pacato cidadão. Perigos e ameaças de que o Homem Aranha nos há-de proteger e salvar no meio e ao cabo de arriscadíssimas aventuras. Lances de cortar a respiração. Perigos de gelar o sangue. Sustos de morte. A tudo isso o Homem Aranha há-de fazer frente, para tranquilidade das nossas almas assustadas.

Porque a verdade é que o mundo se tornou um sítio perigoso onde se viver. Mais que uma frase feita, a realidade justifica o alarme. Obama ou Mccain? Em quem votará o Homem Aranha?

Não, ainda não foi tudo dito. Ainda não se escreveu tudo o que havia a escrever. Ainda não se contou tudo… Todos os pormenores. Todas as leituras. As entrelinhas…

Da eleições presidenciais norte americanas que hoje se decidem.

Obama e McCain… a Grande Luta. The Big Fight é como o Diário de Notícias lhe chama.

E a ilustrar a legenda está a fotografia. Pela legenda fica-se em crer que a fotografia foi tirada numa qualquer praia norte americana. E na fotografia vê-se que alguém construiu em areia duas gigantescas efígies dos dois candidatos e ainda, em ponto mais pequeno o próprio Capitólio – não o do parque Mayer, em Lisboa, obviamente, mas o de Washington, a famosa Casa Branca. Tudo isto foi construído sobre um fundo de areia colorida. Um fundo verde onde se abre em espécie de arco íris unindo os dois candidatos, a bandeira dos Estados Unidos.

Pelo areal, à beira mar, uma dúzia de pessoas observa a obra. Enfim, nem todas. Algumas passeiam-se pela beira do mar. Algumas arriscam mesmo dois passos dentro de água, a molhar os pés.

The Big Fight é também a legenda que o autor da obra gravou na areia, à laia de título.

Quanto ao DN, a legenda é outra. Começa por anunciar que é hoje

O grande dia. O dia das eleições nos Estados Unidos. Consta que sim. Depois, continua-se e aqui há que fazer a vénia e a reverência ao abnegado escriba da prosa que se segue. Há que lhe louvar o esforço. Vamos à legenda. “Os dois rostos escavados na areia profetizam um combate feroz, mas também uma mão cheia de antíteses. Obama está á direita” - e na fotografia está de facto – “mas a sua preferência politica pende para o lado esquerdo da balança.” Sorte a do jornalista, que se a fotografia tivesse sido tirada de outro ângulo, lá se ia o trocadilho… Adiante. Depois, continua a legenda no DN … depois, “só um dos candidatos vai morrer na praia e não os dois, como podem sugerir as esculturas que jazem no chão.” Disso já vos tinha falado, das duas esculturas que jazem no chão. E por fim, conclui o DN – “podemos dizer que Mccain está mais perto de ficar a ver navios” – ora aí está. Na praia, o mar ao fundo … sítio ideal para ver navios… - a ver navios, portanto, “pois o discurso de que a presidência é areia a mais para a camioneta de Obama não pegou”… esculturas de areia… areia para a camioneta…

Há profissões ingratas…. Haver há. Mas, neste caso, pelo menos, nem tudo é prejuízo. Longe disso. Depois de uma abordagem destas às espectaculares eleições presidenciais norte americanas, depois de uma prosa como a que tivemos o privilégio de ler, somos forçados a concluir que é possível sim senhor, fazer omoletas sem ovos.

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

a pão-de-ló, nunca podia mexer-se muito

E já agora deixem que vos fale do caso deste alegado narco traficante que foi detido e libertado por ordem do tribunal, porque a mãe é analfabeta. Dito assim soa estranho, mas dito de outra forma, não melhora muito. Foi o tribunal da relação de Lisboa quem ordenou a libertação do detido. E, no caso, o sujeito foi detido depois de ter sido apanhado com mais de 7 quilos de haxixe em casa e dinheiro falso e munições e armas de fogo.

A captura foi quase por acaso. A polícia interceptou a mãe do suspeito a tentar passar uma nota falsa de 50 euros.

Foi ela também quem autorizou a busca à casa, onde a polícia descobriu a droga e o mais que já se disse. Ora acontece que agora o tribunal foi forçado a libertar o suspeito já que a busca foi autorizada pela mãe que é analfabeta e pela lei uma pessoa analfabeta não estará autorizada a … autorizar. Pelo menos operações deste tipo.

É verdade que a notícia não diz se a autorização pedida no caso exige a assinatura – no caso, da mãe do suspeito. Não diz, mas também, para o caso pouco importa. O que conta é esta evidência indesmentível. Um suspeito apanhado com mais de 7 quilos de droga em casa, dinheiro falso e armas ilegais foi devolvido à liberdade … porquê? Por falta de provas? Por provas inconclusivas ou insuficientes? Por não haver risco de fuga? Não. Porque a mãe é analfabeta e a autorização, mesmo oral, de busca à residência não vale nada e as provas assim conseguidas valem menos que zero aos olhos da justiça portuguesa. A justiça que como sabemos é representada de olhos tapados com uma venda de pano. O que, convenhamos, também lhe não deve dar muito jeito para ler. Seja o que for

Outros casos…

Crise e fraudes obrigam Estado a nacionalizar um banco, 33 anos depois. No DN.

Estado nacionaliza bancos – BPN será público. No Jornal de Negócios.

Operação furacão leva BPN à falência. No Correio da Manhã.

Governo nacionaliza BPN para salvar sistema financeiro. No Diário Económico.

Nacionalização do BPN permite salvar depósitos. No JN.

Os bancos privados não quiseram salvar o BPN e o Governo optou pela nacionalização. No Público.

E estão quase todos os títulos. Falta o do 24 Horas – Antiga administração do BPN investigada por gestão danosa e cada família gastará mil euros para salvar a banca.

Crises e fraudes… 4 mil milhões para salvar a banca… mil euros por contribuinte, se dividirmos o mal pelas aldeias… gestão danosa… de tal maneira danosa que nem os próprios pares do ramo – os outros bancos – quiseram pegar no BPN e deixaram-no para o Estado que, por sua vez comprou o banco, mandando a factura para casa dos cidadãos.

Enfim há que reconhecê-lo. É que no entanto ela move-se, a economia portuguesa. Combalida, convalescente, mas mexe-se. Também, alimentada a pão-de-ló, nunca podia mexer-se muito mais que isto. É que o pão-de-ló é doce mas alimenta pouco.