Nem 8 nem 80, costuma-se dizer... Neste caso, haverá decerto um meio-termo, entre o optimismo de quem assegura que tudo vai acabar bem no melhor dos mundos e os arautos do apocalipse, os profetas da desgraça.
E vem isto a propósito das declarações de Basílio Horta, ontem e à margem de uma conferência sobre as relações económicas entre Portugal e Angola.
Queria-se saber o que pensava sobre a crise, o presidente da AICEP – a Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal. Uma agência governamental, que se propõe captar investimentos estrangeiros para o país. E respondeu então, Basílio Horta, que não sabe o que há-de fazer.
No Correio da Manhã, Basílio Horta diz que o Governo já fez tudo o que podia ser feito, para combater a crise. Acrescenta depois, que o Executivo está a fazer tudo o que pode para travar os efeitos da crise. Já fez tudo o que havia para combater a crise e está agora a fazer tudo para combater os efeitos da já referida e supracitada crise; o que, se atentarmos bem, são de facto, ou podem ser, duas coisas distintas. Lembra que o Governo criou, antes mesmo de outros parceiros da União Europeia, linhas de crédito para as empresas, medidas de apoio às famílias e por aí fora. E por isso, tudo o que pode ser feito, foi feito e não há mais nada a fazer É por isso que Basílio Horta se sente angustiado, por exemplo, com as notícias diárias de despedimentos.
Passamos ao Diário Económico e afinal não! Ou seja – diz a manchete que, para Basílio Horta, o Governo pode ainda fazer mais contra a crise. Diz o jornal, que foi a dimensão da crise que levou o presidente da AICEP a esse raro desabafo. Raro e arrasador! “Um abalo de terra”, foi como classificou a situação provocada pela crise financeira e económica em curso. “Uma crise gravíssima, quase como um abalo de terra, que está a gerar uma angústia profunda, porque não sabemos o que fazer mais”. Que ela é tão grave, que é quase uma emergência nacional, a exigir que se ultrapassem todas as divergências partidárias e se avance num esforço conjunto, de solidariedade nacional. Nada como uma pessoa avalizada, para nos dizer o que já se sabia. Sempre dá outro lastro à informação, outro crédito à própria realidade. E a realidade é que a crise é muito forte e Portugal não está isolado – é ainda a conclusão de Basílio Horta…
Basílio Horta, que diz que, apesar de tudo e deste cenário quase sem esperança nem saída, a agência que dirige está a fazer tudo o que pode, para amenizar os efeitos da crise.
E os efeitos sentem-se de forma violenta nos despedimentos diários. Isso aumenta a angústia de Basílio Horta, que às televisões e à saída da tal conferência lembrou que, todos os dias, há empresas a fechar e fazer lay out !
O Diário Económico reproduz entre aspas a declaração de Basílio Horta – “todos os dias há empresas a fechar e a fazer lay off”.
Claro que sim. Foi mesmo um lapso de linguagem de Basílio Horta, que o jornal em bom tempo e educada e discretamente corrigiu. Lay out, em vez de lay off, é um erro que qualquer um pode cometer, num contexto tão mais assustador, como é esta crise que nos ameaça.
Mas, mais que a coisa em si, assusta é ouvir, figuras com responsabilidades de gestão de parte dos nossos destinos confessar, que já não sabe o que há-de fazer mais… Como quem ata o leme ao mastro e encomenda a alma à Senhora das Tempestades…
E esta tem chamada de capa no Jornal de Negócios de hoje e diz que as farmacêuticas estão a recorrer aos tribunais, para evitar a concorrência dos medicamentos genéricos.
O assunto merece duas páginas na edição de hoje do jornal. E logo de entrada expõe-se o essencial dos argumentos em confronto. De um lado, uma representante de uma farmacêutica multinacional diz que as empresas de genéricos estão a explorar a falta de uma justiça rápida em Portugal… do outro, o representante da Associação Portuguesa de Genéricos diz que é totalmente ilegítimo, que as empresas tentem alongar o período de patente, por forma a impedir a entrada dos genéricos no mercado.
Porque será isso que está a acontecer. O número de processos entrados em tribunal conta-se às dezenas. Uns merecem despacho a favor dos laboratórios queixosos, outros dão razão às empresas de genéricos, admitindo que a concessão de “Autorização de Introdução no Mercado” não viola os direitos de propriedade industrial dos laboratórios detentores das patentes. Há mais, entretanto… Consta que, conforme as comarcas, assim a decisão. Ou seja, por exemplo, em Sintra consta que as decisões têm sido mais favoráveis às empresas de genéricos, enquanto Lisboa se inclina mais perante os argumentos dos detentores das patentes originais dos medicamentos. O jornal relata mesmo um caso, em que o laboratório queixoso preferiu levar a queixa ao tribunal de Lisboa, porque desconfiava que no de Sintra podia perder a causa.
E aqui, a história, que já se arredava manifestamente do território da saúde pública e do bem comum, se entorna completamente para um outro cenário
Fala-se entretanto num estratagema que, os laboratórios alegadamente em prejuízo, encontraram para ir levando a água ao seu – deles – moinho. São as acções judiciais. Porque, em principio o que se faz é interpor uma providência cautelar sobre o Infarmed, para travar a comercialização dos genéricos. Esse é um processo de resposta relativamente rápida, por parte dos tribunais. Acontece que, como já aconteceu, quando os tribunais acabam por dar razão aos dos genéricos, então os queixosos avançam com uma acção principal – é assim que se chama – e isso já é coisa para se arrastar até anos, a ser despachada pelos tribunais…
A matéria é delicada e já percebemos – pelo menos – os interesses essenciais que estão aqui em jogo. Fica claro que, a propriedade industrial e o direito de autor certamente, mas, o que mais assusta os laboratórios, são os milhares de euros, que podem perder por ano, com a entrada dos genéricos em força no mercado. Um responsável, por um laboratório de genéricos, disse ao Jornal de Negócios que, se lhe tivessem aprovado 3 medicamentos que queria introduzir no mercado, teria facturado, com cada um deles, qualquer coisa como 3 milhões de euros de receita, num ano. Com cada um deles!
Agora e já de saída deixem que partilhe convosco esta dúvida. Cito o Infarmed, tal como o jornal o faz…e diz assim: “o Infarmed entende que, a concessão de AIM (Autorização de Introdução no Mercado) a empresas de genéricos, não ofende os direitos de propriedade industrial das empresas titulares de patentes, pois tais direitos apenas são susceptíveis de ser violados com a efectiva comercialização dos medicamentos.
Portanto, depois de oficialmente autorizados a entrar no mercado, para não ofender direitos de propriedade, as farmácias teriam de oferecer os medicamentos genéricos a custo zero aos doentes.
Genericamente soa bem, mas é tão pouco provável como curar gripes com água oxigenada.