segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

Haja Deus!

A notícia é do DN, a ideia, essa nasceu em Inglaterra e já saiu para a rua em Espanha também. E a ideia é pintar nos autocarros esta frase garrafal: Deus provavelmente não existe, por isso pare de se preocupar e goze a vida.

A polémica campanha, como lhe chama o Diário de Notícias. Polémica em Inglaterra, mais polémica ainda em Espanha, país tradicional e fervorosamente católico e promete também trazer a polémica para Portugal, se for avante. É só questão de angariar os meios logísticos necessários. A Associação Ateísta Portuguesa está então a pensar em lançar campanha idêntica, em Portugal e nos autocarros portugueses.

Em Espanha, sabe-se que ela já provocou reacções e até contra campanhas, com mensagens de teor cristão.

O jornal foi conferir a opinião do bispo português das Forças Armadas, Januário Torgal Ferreira. Diz o bispo que – citemos: “tendo em conta a mentalidade portuguesa, que é fechada, acho que o tom pode chocar alguns crentes.”

Paremos um segundo aqui nesta primeira declaração do bispo português. Diz que pode chocar alguns crentes, porque a mentalidade portuguesa é fechada. Admite, portanto que não estamos aqui perante nenhum crime de lesa divindade, nem heresia. A questão aqui é a mentalidade ser fechada. Continua o bispo Torgal Ferreira, que “temos de ter abertura, humor e amor para compreender estes fenómenos…” Porque, continuamos a citar… porque, “tal como as diferentes concepções religiosas sentem necessidade de intervir, também aqueles que não acreditam têm a mesma liberdade.”

Aqui, podíamos fazer a segunda breve paragem, só para deixar esta dúvida metafísica… será mesmo que estes ateus que levantam a questão, de que provavelmente deus não existe – nem sequer é uma certeza, note-se – será que acreditam mesmo nisso?... Ou seja, se fosse tão evidente essa inexistência, por que diabo haveríamos de perder tempo e tinta com o assunto?!...

A Associação Ateísta Portuguesa faz questão de afirmar, que defende o direito de qualquer um a acreditar no deus, ou deuses, de suas próprias devoções… O Bispo Torgal Ferreira também acha que , quem tiver convicções religiosas sérias, não se deve sentir incomodado e que esta campanha, apesar de espampanante e ostensiva, é sinal de que vivemos numa sociedade livre e democrática. E depois, continua o bispo, pode até ser uma boa oportunidade para as pessoas, de forma cívica, trocarem impressões e abrirem linhas de diálogo.

O mentor da ideia original, Richard Dawkins, professor em Oxford, defende que o propósito é rejeitar, numa atitude científica, mas sobretudo moral, valores repugnantes, como a homofobia ou a discriminação das mulheres. É triste, concluir-se que estas duas circunstâncias enunciadas se possam colar, ou imputar à vocação religiosa de cada um, mas, o professor deve ter-se informado, antes de o afirmar.

O DN foi entretanto conferir a opinião de Helena Vilaça, uma socióloga da religião. E diz Helena Vilaça, que se espanta com o facto da lógica de mercado entrar em força na religião, ou seja, que não é comum ver o produto religioso ser objecto do mesmo tratamento publicitário que um detergente. Isso é, segundo o DN, o que mais surpreende esta socióloga. Diz ainda que é pouco comum a publicidade religiosa na Europa, porque nunca houve competição no mercado da religião no continente europeu.

Uma vez mais e também aqui deve ter havido uma recolha criteriosa de informação histórica, que permita a Helena Vilaça tal afirmação. Uma recolha que terá eventualmente passado por cima, ou ao lado, dos conflitos entre protestantes e católicos no Reino Unido, ou, recuando ainda um pouco mais, da expulsão dos filhos de Alá do Al Andaluz e do Al Gharb, em nome da Cruz e da Fé de Cristo.

Agora, quanto à frase da anunciada polémica… soa que , por mais espampanante e ostensiva que seja, como lhe chamou o bispo Torgal Ferreira… ela quase que se desmonta a si própria, ou deixa, pelo menos uma ponta solta. Aconselha a que deixemos de nos preocupar, porque deus provavelmente não existe. Então, não era essa uma das tarefas – chamemos-lhe assim – de deus?!... Ser o último garante, a última esperança, quando tudo corre mal. Ou seja, quando já não há saída, haja fé e seja o que deus quiser...

Então, se deus provavelmente não existe, quem é que, eventualmente, nos acode?!...

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