O cronista social.
Há profissões curiosas e há outras que têm de si, muito mais que aquilo que à primeira vista podem parecer.
No caso, a profissão é a de cronista social.
Uma profissão que requer muito mais que uma redacção escorreita – que isso é quase o mínimo que se pede a quem faz da escrita ganha-pão, ou manifesto.
A um cronista social pede-se ainda uma atenção muito especial, que se distingue e demarca daquela que é exigida a outro qualquer jornalista, ou cronista em geral. Uma atenção dirigida a pequenos e subtis pormenores, a imperceptíveis gestos. Um certo olhar sobre a actualidade e quem a habita. Um olhar que vê, o que escapa ao comum cidadão. Um olhar que vê através do fumo das aparências e não se deixa enganar.
Pois o cronista social do Correio da Manhã tem-no. Esse certain regard.
E, com toda a justiça, o jornal concede-lhe diariamente uma página inteira, onde sob a classificação genérica de Famosos, o cronista social escreve sobre tudo o que sabe, vai sabendo, viu, ou ouviu dizer sobre gente famosa.
Hoje ficamos a saber, por exemplo que a filha de Carlos e Letizia, príncipes de Espanha e das Astúrias, faz hoje 3 anos e já está uma mulherzinha. Famosos sem dúvida e felicidades à jovem princezinha…
Ou então estoutra. E estoutra é que é verdadeiramente interessante, intrigante, e crê-se que particularmente importante. E importante para toda a gente. Não só para aqueles clientes normais e costumeiros deste tipo de informação. Importante mesmo para quem ache que a chamada crónica social é informação menor, descartável… para quem ache que a imprensa cor-de-rosa – como às vezes também se lhe chama – é coisa de gente com pouca cultura e ainda menores aspirações. Coisa menor, coisa sem valor de nenhuma espécie. Pois bem, atentemos então nesta breve. Rita Guerra, para quem não saiba é uma cantora de música ligeira bastante popular entre os amantes do género. Não é de todo uma desconhecida. É famosa, mesmo. Por isso aparece hoje aqui, nesta página de gente famosa. E o que se diz?
Que Rita Guerra tem passado várias vezes na zona do marquês de Pombal, sempre sozinha e apressada. E que na quarta-feira voltou a ser vista no seu carro na rua Rodrigues Sampaio. Continua-se dizendo que é difícil não dar pela passagem da Rita Guerra por aquelas ruas, já que conduz um jipe preto cheio de malmequeres brancos estampados por todo o lado. O cronista acaba a breve nota com a pergunta. Que andará Rita a fazer?...
Pode ser uma pergunta, pode ser uma provocação, apenas inteligível para iniciados…
E também pode ser só uma pergunta académica. Uma figura de estilo.
Pode ser muita coisa. Mas, se por um lado, há uma parte de nós que deseja que a jovem cantora ande a fazer qualquer coisa estranha e quase sobrenatural, ou absurda, às voltas no marquês de Pombal… uma qualquer actividade muito secreta, ou muito proibida – que a vida precisa destes mistérios para nos animar… por outro lado, o mais certo é o cronista ter surpreendido a jovem artista à procura de um sítio para estacionar o jipe. O que, na zona do marquês não é fácil.
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