terça-feira, 30 de setembro de 2008

(chamemos-lhe assim, que é mais prático)

Vem no “Público” e em página inteira.

Em ante-título explica-se que, na generalidade dos casos, é o director geral dos impostos quem permite o acesso às contas.

Em letra maior, adianta-se depois que, no caso das contas dos advogados, é precisa uma autorização judicial, para que se levante o sigilo bancário.

Ora, não está aqui em questão saber que direito terá a Direcção Geral de Contribuições e Impostos para investigar as contas e os movimentos bancários de cada um. Há casos em que esse procedimento é necessário e justificado. Casos que respeitam entretanto uns quantos requisitos prévios e bem explícitos. O que acontece é que - segundo a notícia - o Supremo Tribunal Administrativo considera que, sempre que um advogado invoque o segredo profissional, o fisco fica impedido de levantar o sigilo bancário de forma administrativa. Mais que isso, considera que a Direcção Geral de Contribuições e Impostos não tem competência para decidir sobre o que é, ou deixa de ser segredo profissional.

Assim sendo, o Fisco (chamemos-lhe assim, que é mais prático) o Fisco só pode aceder às contas bancárias dos advogados, para confirmar, por exemplo, as declarações de rendimentos, depois dos tribunais verificarem que essa consulta não põe em causa o segredo profissional, a que os advogados estão sujeitos.

O jornal evoca um caso concreto, passado em Agosto, quando o Supremo Tribunal Administrativo acabou por dar razão ao queixoso – um advogado – e recusou o recurso interposto pelo próprio director geral dos impostos. Azevedo Pereira tinha interposto o recurso, depois do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé ter decidido que a conta bancária desse advogado não podia ser divulgada, por razões de segredo profissional.

Na altura, Azevedo Pereira argumentou que apenas se pretendia consultar “os extractos bancários e os documentos que os suportam, os quais não são susceptíveis de revelar qualquer informação sigilosa relativamente ao negócio do cliente que consta, designadamente, dos recibos emitidos pelos advogados pelos serviços que prestam” – acabámos de citar.

Continua o “Público”, dizendo que o Supremo defende a tese contrária. A de que “há um regime diferenciado quando o acesso à informação está protegido pelo sigilo profissional, ou qualquer outro dever de sigilo e quando apenas esteja em causa o sigilo bancário.

Neste caso, o do sigilo profissional, é mesmo precisa a autorização judicial expressa.

E passemos de novo ao discurso directo. Do acórdão do Supremo o jornal sublinha esta passagem: "tendo, o ora recorrido, alegado que não poderia disponibilizar as contas bancárias, porque nas mesmas existiriam movimentos cobertos pelo sigilo profissional, não se revelaria admissível, que a administração tributária, não especialmente vocacionada para a ponderação do complexo de valores e direitos envolvidos, tivesse a possibilidade de derrogar administrativamente a protecção conferida por esse dever de sigilo, sem prévia sindicância judicial.” Citàmos.

Ora bem! Segredos todas as profissões os têm e algumas bem ciosas deles o são! Desde as cozinheiras, que guardam a sete chaves o segredo, por exemplo de um bom bacalhau à Brás , ou do molho das francezinhas, até… por aí fora.

No caso concreto dos advogados, a questão é obviamente outra e percebe-se que a discrição, o segredo mesmo, sejam a alma do negócio, ou pelo menos, uma recorrente ferramenta de trabalho. Percebe-se. Como, com um pequeno esforço, ou se calhar só com um pouco mais de informação, também acabaremos por perceber, porque é que o sigilo profissional dos advogados os obriga a reagir como um vulgar narcotraficante que, este por razões óbvias, também poderá invocar o segredo profissional, para se recusar a divulgar extractos e movimentos bancários. “É que era só mesmo o que mais faltava!” – isto era já o narco traficante a falar…

E já lhe chamam “Lisboagate” e todos os jornais de hoje falam disso.

Já houve devoluções voluntárias. 18 casas foram já devolvidas à Câmara de Lisboa.

Falamos claro do caso das casas camarárias, alugadas a baixo custo a pessoas que alegadamente teriam possibilidades financeiras para pagar uma renda normal.

Há vários dirigentes da Câmara de Lisboa nessa situação e ontem mesmo António Costa garantiu que todos esses casos serão analisados e corrigidos a seu tempo. Mas foi ontem também, que Sara Brito, vereadora, falou à comunicação social, para explicar e defender o seu caso concreto.

E o caso concreto de Sara Brito , segundo a própria, foi que recebeu a casa de Kruz Abecassis em 87. Na altura era vereadora da Acção Social e que por isso não havia impedimento legal para o fazer. Não havia – segundo a própria – problema ético. E não havia porque, sendo vereadora da Acção Social, o problema ético só se punha se a casa fosse de habitação social. O que não era o caso e o que também quer dizer que se não era habitação social, seria de qualidade um bocadinho superior. Eventualmente… Aí viveu durante 20 anos, até ao fim do ano passado, quando ocupou o pelouro da habitação. Então sim, havia um impedimento legal e a vereadora entregou a casa de volta à Câmara. Diz que não podia ser inquilina e senhoria ao mesmo tempo, o que aconteceria se continuasse a viver no apartamento da rua do Salitre, sendo vereadora da habitação. Esse foi o argumento – segundo as palavras da própria: “Iria criar uma complicação.”

Os jornais garantem entretanto que, para além de figuras mais ou menos conhecidas da vida pública portuguesa, há também sedes de partidos, que pagam à Câmara de Lisboa rendas que chegam aos 5 euros por mês.

Mas voltemos rapidamente a Sara Brito e só por uma outra razão quase paralela.

A autarca diz que nunca viveu clandestina e que por isso não se sente culpada, nem com razões para se demitir. Sempre pagou as rendas que lhe foram pedidas, incluindo as respectivas actualizações. Portanto legalmente já vimos que parece que está tudo bem e eticamente, pelo menos para a vereadora, também.

Agora o que se passa é que os jornais – o “Público”, por exemplo – puxa para título esta frase espantosa: “Vereadora que pagava 146 euros de renda à Câmara de Lisboa recebe reforma de 3350 euros.”

Esta é que é a grande surpresa! Um funcionário do Estado na reforma – e para o caso nem interessa se a reforma é folgadita ou não… é a que se lhe deve, certamente… - mas , para todos os efeitos, temos um funcionário público reformado que continua a trabalhar , no caso, na mesma função pública. Enfim, a verdade é que a notícia não explica muito bem se a reforma é da função pública, ou de uma qualquer anterior profissão que Sara Brito tenha exercido; há 20 anos, ou mais; enfim, antes de trabalhar na Câmara de Lisboa. Isso, não consegui perceber bem, mas o que é evidente é que – casas da Câmara aparte - Sara Brito está reformada e continua a trabalhar. E na função pública.

Ético deve ser, mas será legal?

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