sexta-feira, 23 de maio de 2008

Efeméride


A 23 de Maio de 1408 nascia, às portas de Alfama, Albano Borboleta, esforçado cultor de Artes Marciais e exímio Lavador de Janelas. Apesar de vir a tornar-se figura incontornável da cultura do seu século 15, teve uma infância discreta, apagadita mesmo. Ficou coxo aos dez anos, derivado ao coice de um burro, que lhe disputava a água no bebedouro municipal, do largo onde brincava. Os pais queriam-no a estudar leis, já as mães tinham outra ideia. Como não se entendiam, Albano Borboleta cresceu auto didacta na escola da vida e, p’ra dizer a verdade, até nem se deu mal. Um dia, porém, uma pessoa disse-lhe que assim não podia ser e ele, então, resolveu largar tudo o que estava a fazer e não fazer mais nada senão isso. P’lo menos, durante um bocado. Só mais tarde, mas muito mais tarde é que sentiu crescer em si a vocação! A que o iria tornar célebre e quase esquecido. A de Lavador de Janelas. Mais! A de Exímio Lavador de Janelas e Esforçado Cultor de Artes Marciais. Mas tudo isso corresponde a um período muito agitado da vida de Albano. Demasiado agitado até para tirar notas, ou fixar acontecimentos. Por isso mesmo, saltamos em branco este período fértil e frenético, se bem que fundamental, da vida de Borboleta e vamos ao que importa. Os pormenores mais bizarros, as histórias nunca contadas, os detalhes desconhecidos. Desconhecidos por todos; pl’o público em geral e até p’los próprios biógrafos e estudiosos do fenómeno. Incluindo, claro está, a nossa própria pessoa. Sabe-se, por exemplo que, um dia foi visto a beber água, com ar desconfiado, no bebedouro municipal. Seriam umas 10 da noite, segundo os relatos que sobreviveram ao fogo que se seguiu. Albano Borboleta debruçava-se sobre o tanque do bebedouro, mas as orelhas viravam-se-lhe para trás, tremendo de nervosismo mal disfarçado… e pouco mais se sabe, dessa noite fatídica. O grande incêndio que reduziu, minutos depois, a vila a cinzas, acabou, ingratamente, por ocupar as principais linhas da memória do povo local, apagando quase por completo o testemunho desse feito magnífico, que foi o regresso de Albano ao bebedouro da praça, anos depois do coice do burro o ter posto a coxear para a vida inteira! Posto isto, seria quase injusto, se não imperdoável, mesmo, na data em que se celebra a comemoração em memória de uma personalidade tão rica e importante, não salientar aqui a riqueza e importância da personalidade e da memória do homem que hoje aqui nos traz e que, no seu tempo, nunca haveria de imaginar que estaríamos aqui hoje, a falar dele. Nem ele, nem eu, se mo tivessem perguntado ontem à noite. Bom dia.

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