Homicídios, já se sabe, há os voluntários e os outros… por negligência. Disso já todos ouvimos falar. Portanto aqui, estaríamos perante um homicídio por negligência. Enfim a hipótese punha-se… Existia esse risco real. O de algumas partes do engenho não se desintegrarem, ou incendiarem, na reentrada na atmosfera e acabar contaminando áreas densamente habitadas, cá em baixo. Falamos do tal satélite espião norte-americano que foi abatido, ontem, durante a nossa madrugada. Um único míssil, disparado do Lake Erie, ao largo do Havai, destruiu o satélite em pleno voo, fazendo cair os destroços nas águas do Pacífico. Os tanques do satélite – satélite que afinal nunca chegou a fazer espionagem nenhuma, já que, alegadamente, um computador de bordo avariou e tornou o satélite inútil para todos os efeitos previstos… pois os tanques do satélite estavam cheios de hidrazina. Quase meia tonelada de hidrazina. Um combustível tóxico, que poderia contaminar populações no Canadá, Irlanda, Escócia e América do Sul. Queimar-lhes os pulmões até à morte… E isso poderia acabar por acontecer, já a 1 de Março, se não se tivesse apressado a destruição do engenho. As autoridades garantem que a hipótese de sucesso da operação se fixa entre os 80 e os 90%. Mas só as 15 horas a seguir à explosão podem assegurar o êxito. 15 horas é o tempo que demoram os primeiros destroços a cair na Terra.
Ora, acontece que esta operação já provocou reacções de preocupação e denúncia.
Moscovo diz que se tratou de um teste balístico camuflado… Também a China, que já usou um processo semelhante para se livrar de algum lixo astronáutico… também Pequim considera que estamos perante uma operação militar e pede mais explicações a Washington. Teme-se que, o que está em causa, seja uma experiência para avaliar a capacidade norte-americana de destruir satélites e outras geringonças semelhantes de outros países. Uma espécie de remake da "Guerra das Estrelas"!
Washington já desmentiu a insinuação, garantindo que não foi testado nenhum novo sistema de abate de satélites, próprios ou alheios… E que também não era a intenção, destruir componentes secretos deste satélite em particular, já que, na reentrada na atmosfera, toda a informação classificada haveria de arder no impacto.
Para a NASA, o objectivo é e sempre foi muito claro! Abater o satélite e prevenir o desastre e, por outro lado, ensaiar o sistema balístico anti-míssil…
Seja como for, a discussão está relançada, sobre o uso de armas no espaço.
Para a União dos Cientistas Preocupados (UCP), a destruição do satélite está a anos-luz de ser uma boa solução. Sejam quais forem os motivos, a demonstração de um sistema anti-satélites é contraproducente para os interesses norte-americanos a longo prazo. Disse-o Laura Grego, da UCP. Que, se o Pentágono demonstra que os seus sistemas de defesas com mísseis podem destruir satélites, será muito difícil convencer outros países, que não devem desenvolver capacidades semelhantes…
E isso são, entretanto, outras guerras. Para já, as populações do Canadá, Irlanda, Escócia e alguma América do Sul podem dizer que venceram uma batalha… o de não serem envenenadas, nem que seja por negligência, por essa arma de destruição em massa, que, ao que parece, pode ser a combustível hidrazina!
E agora outros voos…
“Londres acaba de reconhecer a paragem de voos da CIA em território inglês.”
O ministro dos negócios estrangeiros assumiu que dois aviões fizeram escala de reabastecimento na ilha Diego Garcia, território britânico, no oceano Índico.
Dois voos, que transportavam suspeitos de terrorismo, fizeram escala em Diego Garcia, em 2002. O ministro lamentou que essa informação tivesse sido negada até agora.
Washington já disse que foi um erro administrativo…
De acordo com a administração norte-americana, a que o governo inglês terá tido acesso, na semana passada, a base do Índico foi mesmo utilizada pelos aviões ao serviço da CIA. O ministro Miliband, dos negócios estrangeiros ingleses, pediu desculpa e lamentou ter de corrigir e actualizar agora a informação… Disse que, as primeiras informações que tinha, as passou de boa fé… De boa fé, com base nas informações norte-americanas. Disse mesmo, que se recusava a admitir que Washington tivesse querido enganar Londres. O ministro insistiu que queria acreditar que foi de boa fé que Washington garantiu não haver evidência do uso da base de Diego Garcia. Um porta-voz do departamento de Estado também lamentou ter sido passada informação errada a um bom amigo… Neste caso o amigo inglês. Amigo e aliado, disse. Não se pode falar em encobrimento de dados, mas antes de um erro administrativo. O director da CIA também já explicou que foi uma falha no registo dos dois voos. Disse que o governo tinha informado Londres, de que nenhum voo com suspeitos de terrorismo tinha usado chão, ou espaço aéreo britânico depois do 11 de Setembro, só que depois se provou que a informação estava errada…
A ver se não se conclui o mesmo quanto ao tal satélite espião! Só faltava agora, depois deste trabalho todo, concluir-se que afinal, hidrazina coisa nenhuma, o que o satélite gasta é gasóleo agrícola. Ora batatas!
Não é fria, é requentada… a guerra!
“Israel é uma democracia estável e as armas que detém são para se defender.”
E foi assim que se defendeu, o vice-presidente de um grupo britânico de amigos de Israel: o Labour Friends of Israel. Mas o melhor é contar a história como deve de ser.
Londres acaba de reconhecer que manteve secreta uma referência ao nuclear israelita, como forma de não comprometer as relações com Telavive. Essa referência foi omissa, no primeiro rascunho do dossier em que o Iraque era acusado de desrespeitar a ONU, ao tentar obter armas de destruição massiva… Enfim, dá-se de barato a construção verbal: tentar obter… que do resto e do que ficou provado, tudo se terá ficado por aí… pela tentativa.
O dossier em causa foi redigido em Setembro de 2002, mas só foi publicado na semana passada. O Foreign Office terá mesmo convencido o Tribunal de Informação a manter secreta a referência manuscrita a Israel. O tribunal acatou a sugestão. Para o Ministério dos Negócios Estrangeiros inglês, revelar a referência a Israel iria, não só comprometer a diplomacia, como, alegadamente, prejudicar a capacidade do próprio ministério de prevenir conflitos. Conflitos diplomáticos, subentende-se…
Juntamente com referências desfavoráveis aos próprios Estados Unidos e Japão, a nota referente a Israel tinha sido acrescentada à margem e à mão, por alguém, comentando a afirmação de abertura que garantia que, nenhum outro país, além do Iraque, teria desafiado tão frontal e descaradamente a autoridade das Nações Unidas, nesta guerra das armas de destruição em massa…
Isto é o que diz a notícia. Notícia de hoje. Agora, o que a memória recente diz e relembra é que o tal argumento da defesa pessoal, de que se falava ao início, tem umas barbas quase do tamanho das do próprio Karl Marx… mais hirsutas que o bigode de Estaline.
Barbas, do tempo em que o medo se escondia, fazendo negaças aterradoras por trás de uma cortina de ferro.
“Israel é uma democracia estável... O Iraque é instável e uma ameaça.” Foi o que disse o vice-presidente do Labour Friends of Israel. E que pensam que responderia, se lhe perguntassem sobre o seu próprio regime, qualquer dirigente político no poder, em qualquer país ao cimo da Terra, neste preciso momento em que vos falo; mesmo os mais sinistros e criminosos?!...
Todos, mas todos, haveriam de responder que o pecado mora ao lado.
E a cada um a sua guerra…
(gancho fraco, mas é o que se arranja para passarmos à actualidade nacional…)
O “Diário de Notícias” abre hoje duas páginas inteiras ao assunto: a desigualdade de salários entre os mais ricos e os mais pobres em Portugal. Fica-se a saber que o fosso já foi maior, mas que mesmo assim, os 6,8% – que é a diferença, em número de vezes, entre o salário mais alto e o mais baixo, este ano em Portugal – essa diferença ainda preocupa e indigna muita gente. Ontem, o ministro das Finanças foi a S. Bento, responder à interpelação do Bloco de Esquerda, sobre a Política de Rendimentos e Preços e o Agravamento das Desigualdades Sociais.
O ministro acabou por defender a divulgação dos salários dos mais bem pagos, como forma até de estimular a opinião pública e a pressão social para evitar as tais elevadas discrepâncias…
Francisco Louçã fez as contas por alto e foi directo ao assunto: os gestores, em Portugal, levam para casa, cerca de 32 vezes mais dinheiro de ordenado do que os trabalhadores menos classificados. Classificados, não confundir com qualificados…
Mas a questão não é essa. É que Louçã terá levado à letra o conceito: “estás a perceber, ou queres que te faça um boneco? …”
Mostra o DN, a fotografia de Louçã, ontem, no Parlamento, segurando e exibindo duas fotografias. Na mão esquerda, um retrato pequeno, do tamanho da palma da mão. Na outra, a direita, segura um poster, que se desenrola, revelando também a fotografia de um cavalheiro, bem posto e sorridente. Portanto a ideia era retratar, com a imagem do poster enorme, a figura de um gestor, ou aliás, do ordenado de um gestor, ou do seu poder de compra … E na fotografia mais pequenina, a de um trabalhador, ou antes, do seu poder de compra… Supostamente, a relação de grandeza entre as duas fotografias será, ou seria, de 32 para 1, que é o fosso que o deputado pretende ilustrar…
O fotografado na foto mais pequena é impossível de identificar, pelo menos a esta distância; o da fotografia maior também, mas por outras razões. É que é mesmo uma personagem sem história ou identidade reconhecida publicamente. Provavelmente alguém recrutado para o efeito. Ou talvez a fotografia tenha sido recortada de alguma revista e reaproveitada para o poster metafórico… Depois, foi só fazê-la imprimir em escala ampliada. O poster, enfim, nem é bem poster… é mais no género calendário de parede, com duas finas réguas de madeira, nos topos para o manter aberto e esticado. Réguas de madeira, onde, numa das extremidades se atou uma guita, que permitiria, se fosse esse o caso, pendurar a fotografia numa parede. Mas não é esse o caso. No caso, a guita, o fio, o cordel, se quisermos, serve para Louçã segurar, entre os dedos, o poster da denúncia… e exibi-lo às bancadas e aos representantes do governo.
E é assim, que o DN o mostra, na edição de hoje e nestas duas páginas que dedica ao assunto. O do fosso salarial entre gestores e geridos…
Francisco Louçã, ontem no Parlamento, a falar para o boneco.
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